04/02/2007

Intolerância!


Recebi um email de uma pessoa dizendo que tem lido minhas postagens aqui e que tem achado tudo muito sério, meio melancólico. Quero dizer que provavelmente a escrita de uma pessoa, e sua escolha sobre o que e como escrever, varia de acordo com o período de vida dela. Os escritos refletem sim, em alguma medida, o estado de espírito do escritor. Mas não podemos chegar a conclusões definitivas sobre o estado de espírito de uma pessoa apenas lendo algumas de suas idéias.
Outra pergunta que se impõe, ou melhor, que o email que recebi impôs, foi: todo cientista social é "melancólico" assim? A resposta a esta segunda pergunta está totalmente ligada ao meu comentário no final do parágrafo anterior sobre não se tirar conclusões precipitadas a partir apenas de meia dúzia de palavras despretenciosas. Mas a resposta a esta segunda pergunta vai um pouco além, passando pela necessidade que temos, de classificar ("rotular") e universalizar ("generalizar") uma idéia sobre algo ou alguém. Não sei dizer se esta característica de levar as coisas a sério é comum a todo cientista social, ou se é minha em particular. Também não posso dizer que meus escritos, se são sérios demais agora, serão sempre assim. Se meu estado de espírito mudar meus escritos provavelmente não irá mudar também? Então, pode ser que escreva coisas mais alegres um dia desses.
Tenho que admitir que trato com seriedade mesmo a vida, em especial alguns assuntos ligados à nossa vida em sociedade, principalmente os assuntos que eu estudo: desigualdade social, pobreza, acesso à justiça, ensino superior e profissões. Não consigo tratar estes assuntos sem ser com seriedade, com exceção para piadas sobre advogados.
Mas fico grato ao autor do email que permitiu um maior auto-conhecimento, que eu escrevesse estas explicações e que eu pudesse refletir sobre a intolerância nos nossos dias. Falando francamente, este email foi uma aula de intolerância. Afinal, meu blog está apenas se iniciando. Nem houve tempo para que eu escrevesse direito, pois esta é apenas minha oitava postagem. Quem sabe um dia a mais e eu escrevesse coisas alegres?
Não pensem que o sujeito (ou sujeita) que me enviou o email seja mal-educado(a). A intolerância é uma característica dos dias de hoje (e aqui posso generalizar porque se trata de um conhecimento): vivemos numa sociedade consumista (consumir é também destruir), pragmática (tudo deve ter um objetivo prático), imediatista (a ação antecede a reflexão) e hedonista (tudo pelo prazer, que é sempre efêmero). Estas características da nossa sociedade estão em nós, que somos parte da sociedade, e dão as condições necessárias para a reprodução da intolerância nossa de cada dia. A intolerância ganha terreno fácil numa sociedade do "pra ontem", do "pra já", do "agora mesmo". Mas é claro que nós podemos refrear nosso ímpeto intolerante. Dá trabalho, mas podemos.
Acho que cientistas sociais são importantes ainda.